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Críticas por Pablo Villaça

Datas de Estreia: Nota:
Brasil Exterior Crítico Usuários
13/02/2009 01/01/1970 3 / 5 4 / 5
Distribuidora
Duração do filme
121 minuto(s)

Operação Valquíria
Valkyrie

Dirigido por Bryan Singer. Com: Tom Cruise, Kenneth Branagh, Bill Nighy, Tom Wilkinson, Terence Stamp, Carice van Houten, Thomas Kretschmann, Eddie Izzard, Kevin McNally, Tom Hollander, Harvey Friedman, David Bamber.

 

Encaixando-se na onda recente de obras sobre o Holocausto que adotam uma abordagem narrativa que privilegia o ponto-de-vista de personagens nazistas, retratando-os não como monstros, mas como seres humanos falhos (ver O Leitor, O Menino do Pijama Listrado, Um Homem Bom), este Operação Valquíria concentra-se num episódio particular da Segunda Guerra, quando um grupo de altos oficiais alemães planejou e executou um atentado contra Hitler com o objetivo de desestruturar a liderança nazista e assumir o poder, mudando os rumos do conflito. Porém, ainda que tenha sido inspirado em fatos reais, o roteiro de Christopher McQuarrie (Os Suspeitos) e do estreante Nathan Alexander altera, em prol da dramaticidade e em detrimento da veracidade, motivações e personalidades de figuras-chave da conspiração, o que soa como desonestidade intelectual e até mesmo como irresponsabilidade com relação ao sofrimento de todos aqueles massacrados pela máquina de morte nazista.

 

Depois de um breve prólogo no qual somos apresentados ao protagonista, o Coronel Claus von Stauffenberg (Cruise), o filme salta para 1944, quando o oficial é recrutado por integrantes da resistência alemã para auxiliar no planejamento do atentado ao Führer. Aproveitando-se de uma falha num plano aprovado por Hitler para que o Partido Nazista mantivesse o poder mesmo que ele fosse morto (plano este batizado de Operação Valquíria), Stauffenberg convence os companheiros de empregar as próprias reservas militares do governo como base do golpe – mas, para que isto funcionasse, tudo deveria ser colocado em movimento rapidamente assim que Hitler morresse. Infelizmente, obstáculos inesperados, falhas e hesitações determinantes de integrantes do golpe e, claro, a sorte do Führer acabam complicando os projetos dos rebeldes.

 

Prejudicado em sua tentativa de construir uma apropriada atmosfera de tensão em função de já sabermos que Hitler não morrerá (spoiler! Tarde demais...), Operação Valquíria funciona melhor ao se concentrar nas estratégias e nos planos dos conspiradores, quando ao menos prende nosso interesse como curiosidade histórica. Assim, testemunhar os esforços dos personagens enquanto estes buscam vulnerabilidades na estrutura do governo nazista é infinitamente mais interessante do que ver Stauffenberg avaliando onde deverá plantar a bomba ou mesmo enfrentando dificuldades para ativá-la. Da mesma forma, o filme só se torna mesmo tenso depois da explosão, quando finalmente testemunhamos o caos provocado pela tentativa de golpe e acompanhamos o rápido e trágico colapso dos projetos da resistência. Infelizmente, isto só ocorre no terceiro ato da projeção, quando já havíamos sido obrigados a enfrentar 90 minutos de uma narrativa pouco envolvente.

 

Cineasta que talvez rivalize, entre os diretores contemporâneos, apenas com Spielberg em sua obsessão pelo período da Segunda Guerra, Bryan Singer se dedica com gosto à recriação de época, trabalhando com a designer de produção Lilly Kilvert e com a figurinista Joanna Johnston não apenas para mergulhar o espectador na Alemanha de 1944, mas também para estabelecer um tom conspiratório através dos ambientes claustrofóbicos e mergulhados em sombras nos quais os membros da resistência se encontram (e que combinam com as vozes baixas e expressões cerradas que estes empregam o tempo todo) e, claro, para retratar a opulência das edificações usadas pelos nazistas para moradia e trabalho (reparem na imensa suástica que enfeita o fundo de uma piscina ou o imenso salão no qual Hitler confabula com seus oficiais em meio a chás e risos). Além disso, Singer não hesita em empregar vários intérpretes já veteranos de produções do gênero para facilitar o trabalho do público em identificar a natureza de seus personagens, o que é simultaneamente econômico e simplista: de A Espiã, por exemplo, o diretor toma emprestado não só atores, mas vários membros da equipe técnica, além de escalar, num papel-chave, o alemão Thomas Kretschmann, que já interpretou oficiais nazistas em quase dez filmes, incluindo os infinitamente superiores A Queda! e O Pianista.

 

E já que mencionei A Queda!, é inevitável comentar que a sombra do Hitler de Bruno Ganz prejudica imensamente o trabalho do “Führer” David Bamber em Operação Valquíria, já que se torna impossível não lembrar do brilhante retrato criado por Ganz sempre que Bamber surge em cena como se fosse uma imitação barata do original. Por outro lado, Bill Nighy se destaca ao interpretar o hesitante e covarde General Olbricht, ao passo que Tom Wilkinson, como o General Fromm, merece aplausos por aproveitar o pouco tempo de tela para criar uma figura traiçoeira e imprevisível em sua preocupação de se manter sempre do lado dos mais fortes. Menos sorte, infelizmente, tem Kenneth Branagh, que não tem tempo de fazer o espectador memorizar nem mesmo o cargo de seu personagem (um Major-General). E se Terence Stamp ao menos consegue estabelecer o caráter “nobre” de seu Ludwig Beck (que, na realidade, pouco tinha de nobreza), Eddie Izzard é completamente desperdiçado como o General Fellgiebel, surgindo praticamente como um figurante de luxo.

 

Já Tom Cruise, que recebe a difícil tarefa de carregar um filme sabotado por um desfecho previsível, se sai relativamente bem, embora pareça estar no piloto automático: limitando-se a olhar com intensidade para tudo que o cerca (geralmente fitando seus oponentes de baixo para cima), o ator praticamente permite que as características físicas de Stauffenberg o definam, empregando o tapa-olho (ou o olho de vidro, dependendo da cena) e a mão amputada como claras muletas de interpretação (lamentavelmente, em algumas cenas o “olho de vidro” pode ser visto se mexendo, o que quebra a ilusão e, conseqüentemente, compromete o trabalho de Cruise). Ainda assim, a persona de bom moço do astro, associada ao seu carisma natural, é suficiente para que torçamos pelo sucesso do Coronel, que, além de tudo, faz questão de exprimir seu desprezo por Hitler, pela guerra e pelos campos de concentração.

 

É uma pena, portanto, que Operação Valquíria insista em ocultar aspectos menos agradáveis da história de seu protagonista, tornando-o um herói unidimensional a fim de evitar “confundir” o espectador: ignorados, por exemplo, são os repetidos comentários anti-semitas feitos por Stauffenberg no início da guerra e sua virulência ao se referir à população da Polônia, que ajudou a invadir. Além disso, o filme parece não se deter no fato de que os conspiradores só parecem se tornar determinados a agir depois que a derrota da Alemanha na Guerra se torna clara, o que, para mim, soa mais como covardia do que como tentativa genuína de conter os abusos do Nazismo.

 

E como bem argumentou o jornalista Ron Rosenbaum em um belo artigo publicado recentemente (e do qual discordo apenas no que diz respeito à sua interpretação de O Leitor), este “revisionismo” histórico pode ser bastante prejudicial e mesmo perigoso ao se tornar um primeiro passo para algo muito mais grave e que deve ser combatido com todas as forças: a negação do Holocausto. Afinal, é preciso aprender com a História, não ignorá-la.

 

12 de Fevereiro de 2009

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Pablo Villaça, 18 de setembro de 1974, é um crítico cinematográfico brasileiro. É editor do site Cinema em Cena, que criou em 1997, o mais antigo site de cinema no Brasil. Trabalha analisando filmes desde 1994 e colaborou em periódicos nacionais como MovieStar, Sci-Fi News, Sci-Fi Cinema, Replicante e SET. Também é professor de Linguagem e Crítica Cinematográficas.

 

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