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Críticas por Pablo Villaça

Datas de Estreia: Nota:
Brasil Exterior Crítico Usuários
07/12/2007 28/09/2007 3 / 5 4 / 5
Distribuidora
Duração do filme
133 minuto(s)

Across the Universe
Across the Universe

Dirigido por Julie Taymor. Com: Evan Rachel Wood, Jim Sturgess, Joe Anderson, Dana Fuchs, Martin Luther McCoy, T.V. Carpio, Dylan Baker, Angela Mounsey, Robert Clohessy, Joe Cocker, Harry J. Lennix, Bono, Eddie Izzard, Salma Hayek.

 

Se construir um roteiro interessante e estruturalmente coeso já é tarefa difícil normalmente (como provam as dezenas de porcarias lançadas anualmente em nossos cinemas), tentar montar uma trama envolvente e com personagens bem construídos a partir de inúmeras músicas diferentes é um esforço praticamente impossível – e, infelizmente, Across the Universe é uma prova disso. Contando com figuras batizadas de Jude, Lucy, Prudence, Sadie e outros nomes extraídos de canções dos Beatles (e que já prenunciam a utilização das referidas músicas), o filme escrito por Dick Clement e Ian La Frenais a partir de um argumento concebido ao lado da diretora Julie Taymor é uma bagunça ambiciosa, é verdade, mas ainda assim uma bagunça. Por outro lado, conta com a imensa vantagem de trazer uma trilha composta por vários clássicos da banda britânica, o que, por si só, já o tornaria imperdível para os fãs de Lennon, McCartney, Harrison e Ringo.

 

A historinha é boba e previsível: nos anos 60, Jude (Sturgess) é um jovem humilde de Liverpool (claro) que decide tentar a sorte nos Estados Unidos, onde mora o pai que ele nunca conheceu. Estabelecendo uma forte amizade com o universitário Max (Anderson), ele passa a morar em um apartamento em Manhattan, dividindo o espaço não apenas com o amigo, mas com a cantora Sadie (Fuchs), que estabelece uma parceria romântica e profissional com o guitarrista JoJo (McCoy). Porém, quando Max é convocado para lutar no Vietnã, sua irmã Lucy (Wood) se torna uma ativa militante contra a guerra, o que eventualmente desgasta seu relacionamento com Jude, que não demonstra ter muitas preocupações políticas.

 

Como não poderia deixar de ser, considerando-se sua origem fragmentada, Across the Universe exibe uma estrutura excessivamente episódica que resulta na sensação de que suas cenas foram criadas sem que os roteiristas se preocupassem com o que veio imediatamente antes ou o que ocorreria logo em seguida, importando-se mais em encaixar o maior número possível de músicas e referências aos anos 60 dentro de seus 131 minutos de duração. Assim, Sadie e JoJo surgem como caricaturas pálidas de Janis Joplin e Jimmy Hendrix; Jude e Lucy protagonizam um romance clichê no qual os ciúmes e os mal-entendidos predominam; e a guerra no Vietnã assume o papel simplista de obstáculo ao amor do casal principal. Da mesma maneira, Bono aparece em uma ponta criada apenas para fazer uma alusão (dispensável) a Neal Cassady e Ken Kesey, já que seu personagem, Dr. Robert, é uma mistura dos dois, logo convidando os protagonistas (que assim são transformados nos Merry Pranksters de Kesey) para uma viagem no ônibus eternizado no livro de Tom Wolfe, “O Teste do Ácido do Refresco Elétrico”.

 

Mas tudo é mesmo uma desculpa para que Across the Universe invista em novas versões para os clássicos dos Beatles – e muitas vezes de maneira bem sucedida. Joe Cocker, por exemplo, estrela sua própria leitura de “Come Together”, ao passo que “I Want to Hold Your Hand” se transforma no tocante e melancólico desabafo de uma garota lésbica que não encontra coragem para se declarar para sua amada, uma líder de torcida (e o verso “Let me be your man”, nem preciso dizer, ganha assim uma conotação inteiramente nova). E se a belíssima “Let It Be” ganha força ao acompanhar um garotinho que se esconde atrás de um carro em chamas durante os confrontos raciais entre a polícia e a população negra em Detroit, em julho de 67, a igualmente clássica “Strawberry Fields Forever” é convertida num hino político no qual os morangos passam a simbolizar o sangue derramado pela guerra. Por outro lado, “The Benefit of Mr. Kite” dá origem a uma seqüência surreal – e aborrecidíssima, além de descartável – estrelada por Eddie Izzard, enquanto “While My Guitar Gently Weeps” é utilizada como uma elegia forçada a Martin Luther King.

 

Podendo ser facilmente dividido em “números” de maior ou menor eficácia (como, aliás, indica o parágrafo acima), o filme de Julie Taymor mostra-se uniforme ao menos na qualidade de seu design de produção – e, neste aspecto, a seqüência embalada por “I Want You” surge como a melhor do filme ao trazer Tio Sam alistando jovens que são entregues a um exército de robôs e enviados contra a vontade (em uma esteira!) para o Vietnã, quando surgem carregando a Estátua da Liberdade enquanto destroem o país com suas botas gigantes e cantam o verso “she’s so heavy!” – uma imagem que, por si só, vale todo o longa.

 

É lamentável, portanto, que o fraco roteiro jamais faça jus à imaginação da cineasta, criando subtramas mal desenvolvidas (Prudence vai e vem sem maiores explicações e sua história jamais tem um desfecho apropriado, o mesmo se aplicando ao pai de Jude) e investindo em personagens claramente dispensáveis (Sadie e Jo-Jo se apaixonam, brigam, separam-se e voltam sem qualquer lógica ou explicação). Aliás, até mesmo o ativismo político de Lucy é abandonado no terceiro ato, quando o filme percebe ter chegado a hora de solucionar seu impasse romântico com Jude.

 

Com isso, Across the Universe se apresenta como uma obra frustrante, mas suficientemente curiosa para merecer uma pouco efusiva recomendação.

 

05 de Dezembro de 2007

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Pablo Villaça, 18 de setembro de 1974, é um crítico cinematográfico brasileiro. É editor do site Cinema em Cena, que criou em 1997, o mais antigo site de cinema no Brasil. Trabalha analisando filmes desde 1994 e colaborou em periódicos nacionais como MovieStar, Sci-Fi News, Sci-Fi Cinema, Replicante e SET. Também é professor de Linguagem e Crítica Cinematográficas.

 

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