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Críticas por Pablo Villaça

Datas de Estreia: Nota:
Brasil Exterior Crítico Usuários
12/05/2016 24/08/2016 3 / 5 / 5
Distribuidora
Zeta Filmes
Duração do filme
100 minuto(s)

Na Vertical
Rester vertical

Dirigido e roteirizado por Alain Guiraudie. Com: Damien Bonnard, Christian Bouillette, Laure Calamy, India Hair e Raphaël Thierry.

O artista busca refletir, em sua Arte, sua investigação particular sobre a vida, a condição humana e nossas fragilidades individuais e coletivas. Sua criação pode ser uma comédia descompromissada, um terror sobrenatural ou uma fantasia futurista, mas, de certa maneira, a obra sempre refletirá as preocupações e reflexões de seu criador.


Assim, é apenas natural que o protagonista de Rester Vertical, novo longa do diretor francês Alain Guiraudie (Um Estranho no Lago), insista em procurar a inspiração para seu próximo roteiro nas pessoas que encontra ao longo de uma jornada sem direção ou – para desespero do diretor que espera o material para iniciar as filmagens – um prazo para terminar. Com isso, nos meses e anos que se seguem, Leo (Bonnard) se interessa por um jovem que vislumbrou caminhando por uma pequena estrada, pelo velho e rancoroso homem que vive com este, por uma pastora de ovelhas insatisfeita com sua condição de mãe solteira, pelo pai desta e mesmo por um mendigo que ocasionalmente vê sob uma ponte da cidade.

Leo, contudo, tem um problema óbvio: sua investigação artística é também fria e desinteressada. Ao encontrar aquelas pessoas, ele as encara com um olhar não humano, mas distanciado, frio, sem empatia. Não à toa, em alguns momentos ele observa os demais através de um binóculo, como se estudasse animais em seu habitat natural (o que de certa forma faz) e tentasse compreender o mecanismo biológico que os move sem perceber que os componentes individuais - psicológicos e emocionais – são os elementos que os tornam fascinantes.

A diferença entre nossas percepções particulares, claro, é o que torna o convívio e nossas experiências tão intrigantes – e, assim, quando Leo manifesta sua admiração por lobos apenas para ouvir a pastora responder que os enxerga como pragas, o roteirista a encara com confusão justamente por não possuir algo essencial ao artista: a empatia. Ao longo da projeção, por exemplo, ele acaba assumindo, de uma forma ou de outra, as vidas daqueles que encontra pelo caminho (pai, pastor, babá do velho da estrada e assim por diante) e fracassa em todas – até como mendigo – por não absorver a essência de cada um.

Leo é, para usar uma expressão fabulosa cunhada por Oliver Sacks, como um antropólogo em Marte.

Tematicamente ambicioso, Rester vertical é um esforço válido por parte de Guiraudie após a notoriedade alcançada por seu filme anterior, Um Estranho no Lago – e certamente há elementos narrativos aqui que reafirmam seu talento. Várias sequências, por exemplo, são hábeis ao assumir uma natureza quase que de pesadelo, refletindo o incômodo de Leo diante do que tenta viver: ele fica preso em arbustos, é cercado por uma turba raivosa, vê um bebê chorando no meio da planície enquanto serve de isca para lobos e, claro, vive o terror do escritor de não ter nada para mostrar mesmo depois de anos de trabalho.

Por outro lado, o cineasta demonstra uma frustrante falta de foco em vários pontos da narrativa, quando mergulha em tangentes que, em vez de contribuírem para o desenvolvimento da tese que o filme advoga, parecem apenas repetir inadvertidamente os mesmo equívocos do protagonista, reproduzindo artificialmente incidentes que parecem dizer algo, mas falham em fazê-lo.

Mas o que poderia ser mais apropriado do que uma obra sobre um artista sem direção que acaba por reproduzir seus tropeços?

Texto originalmente publicado como parte da cobertura do Festival de Cannes 2016.

12 de Maio de 2013

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Pablo Villaça, 18 de setembro de 1974, é um crítico cinematográfico brasileiro. É editor do site Cinema em Cena, que criou em 1997, o mais antigo site de cinema no Brasil. Trabalha analisando filmes desde 1994 e colaborou em periódicos nacionais como MovieStar, Sci-Fi News, Sci-Fi Cinema, Replicante e SET. Também é professor de Linguagem e Crítica Cinematográficas.

 

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