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Críticas por Pablo Villaça

Datas de Estreia: Nota:
Brasil Exterior Crítico Usuários
01/01/1970 01/01/1970 3 / 5 / 5
Distribuidora
Duração do filme
112 minuto(s)

Movimentos Noturnos
Night Moves

Dirigido por Kelly Reichardt. Com: Jesse Einseberg, Dakota Fanning, Peter Sarsgaard, Alia Shawkat, Clara Mamet.

Kelly Reichardt é uma diretora cuja abordagem direta e minimalista já rendeu ao menos dois grandes trabalhos: Wendy e Lucy e O Atalho. Distintos em seus temas, mas beneficiados por uma linguagem contemplativa que permitia que realmente conhecêssemos seus personagens, estes dois longas dividem traços claros com Night Moves, novo trabalho da cineasta – especialmente no cuidado com que a dinâmica entre o trio principal é retratada. Desta vez, porém, Reichardt, mais uma vez trabalhando com um roteiro de Jonathan Raymond, perde-se ao parecer não se decidir que história pretende contar, alterando o foco da narrativa a partir da segunda metade da projeção sem conseguir alcançar resultados tão admiráveis quanto na primeira.


Hábil ao nos apresentar aqueles personagens sem depender de diálogos longos e expositivos, Night Moves revela o suficiente sobre o jovem ativista ambiental Josh (Eisenberg) apenas ao observar sua expressão séria e concentrada, sua relutância em falar mais do que o necessário e, especialmente, a delicadeza que demonstra ao lidar com a Natureza – tanto ao depositar um ninho em um galho quanto ao se debruçar sobre uma corça atropelada. Nestes momentos, percebemos que, se fica inquieto diante da nudez feminina ao visitar o spa no qual trabalha sua amiga Dena (Fanning), Josh se mostra infinitamente mais à vontade ao caminhar sozinho pelo bosque próximo de sua casa, levando-nos a indagar se parte de seu interesse ecológico não se deve ao fato de que plantas e animais não o obrigam a conversar.

Concentrando-se nos preparativos para uma ação terrorista feitos por Josh, Dena e Harmon (Sarsgaard, cada vez mais especialista em viver tipos que inspiram desconfiança), a metade inicial do filme provoca tensão e interesse sem que, para isso, Reichardt precise se entregar a convenções de um thriller – e, ao contrário disso, a diretora (também responsável pela montagem) mantém um ritmo estudado que jamais se rende aos cortes frenéticos que poderíamos associar ao gênero. Da mesma maneira, em nenhum instante o filme é dominado por uma trilha que evoca o suspense, optando, na maior parte do tempo, por sons diegéticos que ressaltam justamente a calma do ambiente que o trio de ativistas tanto aprecia. Além disso, a própria relação entre os personagens é construída com paciência – e quando Josh ouve os outros dois transando, comunica toda uma carga de conflitos e sentimentos apenas ao se afastar em silêncio após uma breve hesitação.

Jesse Eisenberg, diga-se de passagem, cria aqui um tipo radicalmente diferente daquele visto em filmes como A Rede Social e Truque de Mestre, surgindo como um homem sempre tenso e calado cuja postura rígida só é levemente abandonada em um breve momento de celebração interna. Enquanto isso, Dakota Fanning vive Dena com um idealismo que soa por vezes imaturo e como fruto de uma revolta quase adolescente, o que não diminui o valor de sua dedicação à causa que defende mesmo que isto se manifeste de maneira extrema e irresponsável. E se Peter Sarsgaard leva o espectador a desconfiar de seu personagem – particularmente de sua competência -, isto é equilibrado por sua confiança crescente à medida que se aproximam da concretização do plano.

Aliás, uma das virtudes de Night Moves é a de evitar qualquer tipo de pregação: quando vemos uma cineasta (Clara Mamet, filha de David) apresentando seu documentário-manifesto, por exemplo, a discussão que se segue com os espectadores de seu filme levanta algumas das questões mais pertinentes quanto a este tipo de filme-protesto – como, por exemplo, o tom apocalíptico que normalmente empregam e que pode servir, num efeito contrário ao esperado, para desanimar o público ao ponto da inação. Assim, em vez de pregar, o roteiro apenas estabelece que aquela causa é importante para os personagens – e, do ponto de vista dramático, é o que basta.

Por outro lado, ainda que seja admirável que o longa busque retratar também as consequências da ação dos personagens, é lamentável que Night Moves pareça perder seu foco narrativo ao tentar cumprir este papel, quando se confunde entre estudo de personagem e suspense, falhando em ambos os papéis.

Seja como for, Kelly Reichardt continua a se apresentar como uma diretora cujo tropeço surge não como fruto de incompetência, mas de um experimento consciente, mesmo que não de todo bem sucedido.

 

Texto originalmente publicado como parte da cobertura do Festival do Rio 2013.

30 de Setembro de 2013

Pablo Villaça, 18 de setembro de 1974, é um crítico cinematográfico brasileiro. É editor do site Cinema em Cena, que criou em 1997, o mais antigo site de cinema no Brasil. Trabalha analisando filmes desde 1994 e colaborou em periódicos nacionais como MovieStar, Sci-Fi News, Sci-Fi Cinema, Replicante e SET. Também é professor de Linguagem e Crítica Cinematográficas.

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