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Críticas por Pablo Villaça

Datas de Estreia: Nota:
Brasil Exterior Crítico Usuários
29/11/2013 01/01/1970 2 / 5 / 5
Distribuidora

Um Time Show de Bola
Metegol

Dirigido por Juan José Campanella. Com as vozes de David Masajnik, Lucía Maciel, Diego Ramos, Juan José Campanella, Pablo Rago, Fabián Gianola, Horacio Fontova, Coco Sily,

Quando descobri que o cineasta argentino Juan José Campanella estava dirigindo um longa de animação computadorizada a ser lançado em 3D, confesso que fiquei curioso, já que, fã incondicional do realizador desde que assisti ao belo O Mesmo Amor, A Mesma Chuva, de 1999, apaixonei-me por todos os seus trabalhos seguintes: O Filho da Noiva, Clube da Lua e O Segredo dos Seus Olhos (todos realizados em colaboração com o magnífico Ricardo Darín). Além disso, se Robert Zemeckis (O Expresso Polar), Wes Anderson (O Fantástico Sr. Raposo), Steven Spielberg (As Aventuras de Tintim) e Gore Verbinski (Rango) haviam se saído tão bem em suas incursões na animação, por que isto não se repetiria com um diretor tão sensível como Campanella?

A resposta: porque este, ao contrário dos demais, parece ter achado que a liberdade oferecida pela técnica dispensaria a necessidade de um bom roteiro.

Escrito pelo cineasta ao lado de Gastón Gorali e Eduardo Sacheri (este último, responsável também por O Segredo dos Seus Olhos), Um Time Show de Bola se inspira em um conto de Roberto Fontanarrosa para narrar a história de Amadeo, um jovem fascinado por totó (ou pebolim) que, sempre praticando na mesa localizada no velho bar de sua pequena cidade, é desafiado um dia pelo arrogante Grosso, derrotando-o de forma humilhante. Anos depois, quando este retorna em busca de vingança já como um jogador de futebol rico e famoso, Amadeo vê sua amada Laura ser levada pelo adversário e, para salvar a garota e a cidade, parte em uma pequena aventura enquanto é auxiliado pelos jogadores de ferro da mesa de totó, agora magicamente vivos.

Amarrando a trama a partir de um prólogo e um epílogo narrados por um homem ao seu filho pequeno (e só não adivinhará sua identidade nos minutos iniciais quem jamais tiver visto um filme na vida), o longa tem início com uma piada pouco original, mas eficiente que usa 2001: Uma Odisseia no Espaço como inspiração para aquele que talvez seja o momento mais divertido da projeção – e o fato deste ocorrer logo no princípio é, claro, um problema grave. A partir daí, Campanella investe numa série de aventuras de caráter episódico, mostrando-se claramente encantado com a liberdade de movimentação de câmera oferecida pelo computador, adotando pontos de vista inesperados enquanto acompanha personagens minúsculos que surfam em ondas de lixo, penduram-se em carrinhos de montanha-russa e participam de uma partida futebol ambientada em um gramado que, para eles, é uma verdadeira selva.

Competente em seus aspectos técnicos, Um Time Show de Bola é, por outro lado, pouco audacioso em seu design de produção, que pega emprestados elementos de obras como Ratatouille (o empresário de Grosso é uma versão mais mefistofélica do chef Skinner), Tá Chovendo Hamburguer (Amadeo parece primo de Flint Lockwood) e Toy Story (nem preciso explicar). Da mesma forma, embora as referências a obras como Apocalypse Now e aos westerns de Leone sejam divertidas, não deixam de soar gratuitas – e são realmente raros os instantes em que o longa nos surpreende com elementos mais originais (entre eles, o fantástico – e impossível – estádio que abriga a partida final). Sim, é preciso aplaudir o cuidado com o visual dos pequenos jogadores de ferro, por exemplo, que surgem com suas tintas cobertas de riscos e manchas, mas por isto mesmo é tão frustrante perceber a falta de uma identidade própria por parte do filme na maior parte da projeção.

No entanto, o grande problema do projeto reside mesmo em seu péssimo roteiro, que parece não ter ideia da história que pretende contar, obrigando-nos a acompanhar reviravoltas que não levam a lugar algum - como praticamente todas as “reviravoltas” envolvendo Beto, desde seu encontro com ratos até seu interesse pelos palcos. Além disso, os roteiristas cometem o erro grosseiro de introduzir um elemento que parece importante apenas no final do segundo ato (as “invenções” de Grosso), descartando-o logo em seguida sem maiores consequências. Como se não bastasse, o filme jamais parece saber o que fazer com sua única personagem feminina importante, basicamente relegando-a ao posto de “donzela em apuros” (isto quando não está manipulando o protagonista por reconhecer o interesse que este nutre por ela) – e não estou certo de que incluir uma ameaça de estupro seja algo apropriado a um longa voltado ao público infantil (mesmo que os espectadores mais jovens não percebam o que está prestes a ocorrer).

Aliás, a falta de foco do roteiro é tamanha que nem mesmo o acontecimento mais fantástico da história – o fato de os jogadores de ferro criarem vida – desempenha qualquer papel importante na trama. Em certo momento, até temos a impressão de que estes influenciarão um acontecimento fundamental, mas não: caso eles jamais se tornassem vivos, tudo aconteceria basicamente da mesma maneira, o que é imperdoável do ponto de vista narrativo.

Sugerindo em seus momentos finais que o propósito da produção é apresentar alguma mensagem sobre a importância da imaginação na infância, criticando o uso ininterrupto da tecnologia (tablets, games eletrônicos) por parte das crianças, Um Time Show de Bola falha até mesmo neste aspecto, já que, correto ou não, este ponto de vista é jogado de forma atrapalhada e frágil na projeção.

Que Campanella volte logo a trabalhar com Ricardo Darín para que possamos esquecer esta sua rara pisada na bola.

26 de Setembro de 2013

Pablo Villaça, 18 de setembro de 1974, é um crítico cinematográfico brasileiro. É editor do site Cinema em Cena, que criou em 1997, o mais antigo site de cinema no Brasil. Trabalha analisando filmes desde 1994 e colaborou em periódicos nacionais como MovieStar, Sci-Fi News, Sci-Fi Cinema, Replicante e SET. Também é professor de Linguagem e Crítica Cinematográficas.

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