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Críticas por Pablo Villaça

Datas de Estreia: Nota:
Brasil Exterior Crítico Usuários
23/06/2011 01/01/1970 2 / 5 2 / 5
Distribuidora

Carros 2
Cars 2

Dirigidopor John Lasseter. Com as vozes de Larry the Cable Guy, Owen Wilson,Michael Caine, Emily Mortimer, John Turturro, Eddie Izzard, Joe Mantegna,Thomas Kretschmann, Bonnie Hunt, Franco Nero, Tony Shalhoub, Jeff Garlin, JasonIsaacs, Bruce Campbell, Vanessa Redgrave, Cheech Marin, Richard Kind, JohnRatzenberger.

Um dia tinha que acontecer. Depoisde permanecer por 16 anos como dona de uma filmografia irrepreensível e cujo longamais irregular (Vida de Inseto) aindaera um passatempo adorável, a Pixar finalmente produziu seu primeiro grandetropeço – justamente a continuação de outro de seus filmes menores, Carros.Se até hoje o estúdio encabeçado por John Lasseter havia privilegiado ahistória e a originalidade, em Carros 2a impressão clara que surge é a de que eles finalmente se renderam ao apelocomercial de um projeto, lançando esta sequência apenas por nela reconhecerem umpotencial comercial invejável envolvendo não só a bilheteria, mas toda umainfinidade de produtos relacionados, de brinquedos a roupas.

Escrito por Ben Queen a partir de umargumento concebido por Lasseter, Brad Lewis e Dan Fogelman, o roteiro de Carros 2 acerta ao investir numahistória diferente daquela vista no original em vez de cometer o mesmo erro damaior parte das continuações e tentar repetir a fórmula anterior – e é umapena, portanto, que a trama escolhida pela equipe seja tão ruim e igualmenteformulaica. Adotando o gênero “espionagem” como base da narrativa, o filme trazRelâmpago McQueen (Wilson) e seu melhor amigo Mate (Larry the Cable Guy) em umaviagem pelo mundo enquanto o carro de corrida participa de uma série dedisputas promovidas para comprovar a eficiência de um combustível alternativo, limpoe renovável. Porém, Mate acaba sendo confundido com um espião norte-americano epassa a encabeçar várias aventuras ao lado do agente Finn McMíssel (Caine) esua assistente Holley Caixa de Brita (Mortimer) enquanto tentam descobrir aidentidade do vilão que busca sabotar as corridas para desacreditar o novocombustível.

Cometendo o mesmo erro da série Piratasdo Caribe ao elevar um personagem secundário divertido quefuncionava bem justamente por colorir a produção em vez de desenhá-la, Carros 2 promove Mate à condição deprotagonista, o que traz dois efeitos imediatos: elimina a chance de um arcodramático que ancore a narrativa e obriga o roteiro a tentar conceber no mínimoo dobro de piadas envolvendo o carro-guincho, diluindo as gags que, na maior parte do tempo, soam previsíveis e poucoinspiradas. Da mesma maneira, a tentativa de criar um conflito através dodesentendimento entre Relâmpago e Mate surge tola e clichê, obrigando oespectador a ouvir o tipo de diálogo artificial e tolo que normalmente nãoencontrava espaço nos trabalhos da Pixar (“Por que você pediria a Mate para não ser ele mesmo?”,diz alguém em certo instante, parando a um segundo de completar com um “Acredite no seu coração!”ou um “Siga seus sonhos!”).

O desespero de Carros 2 em estabelecer algum tipo de solidez em sua trama, aliás,chega ao auge no instante em que Mate, sem aparente razão, solta uminacreditável “Eu já sei oque tem que ser feito!” apenas para concluir que não poderá “fazê-lo”por não sentir segurança em si mesmo, obrigando seu velho amigo a encorajá-lo –e este tipo de maniqueísmo lamentável encontra-se espalhado por toda a obra,começando na cena, ainda no início do longa, em que Relâmpago lamenta a mortede Doc Hudson num monólogo acompanhado por uma trilha artificial apenas para esquecero assunto no exato segundo em que abandona o museu dedicado ao velho mentor(aparentemente, a Pixar decidiu excluir o personagem depois da morte de seudublador, Paul Newman, embora a Kombi hippieoriginalmente dublada por George Carlin não tenha merecido a mesmaconsideração).

Preguiçoso no desenvolvimento deseus personagens e clichê na elaboração de sua trama, o filme comprova a faltade inspiração momentânea de Lasseter até mesmo naquela que normalmente seriauma das sequências mais imaginativas do projeto: o sonho/alucinação de Mate,que acaba se limitando a se apresentar como uma série de flashbacks a partir de pontos de vista diferentes e que, além denada acrescentar à narrativa, ainda desperdiça a chance de mergulhar nainvencionice visual típica do estúdio. Por outro lado, o design de produção do longa é fantástico como de hábito: dosrochedos que remetem a automóveis ao caos urbano, iluminado e multicolorido deTóquio (com seus diminutos espaços para dormir), Carros 2 é um espetáculo estético dominado por superfíciesbrilhantes e atraentes que fazem jus a um universo tecnológico dominado por máquinas, encontrando tempo ainda para(algumas) gags mais inspiradas, comoos dados de um cassino que surgem como aqueles enfeites cafonas de automóveis.De maneira similar, o design dospersonagens é inteligente e orgânico, aproveitando as formas naturais dosveículos como indicativo de suas personalidades – e observem, por exemplo, comoo retrovisor de um dos vilões se converte num sugestivo monóculo ou como váriosdos carros japoneses trazem atributos típicos do animé.

Alcançando seus melhores momentosnas corridas protagonizadas por Relâmpago, quando Lasseter e sua equipe simulama condensação sobre a pista e pedaços de areia atingindo as câmeras, Carros 2 surpreende também nassequências de ação envolvendo a trama de espionagem e que se revelam bem maisviolentas do que o esperado – e é curioso perceber como o cineasta se estendenum longo plano que acompanha a queda de um veículo de uma grande altura até oinstante em que se despedaça no mar, num sadismo inesperado por parte do filme.Além disso, é no mínimo deselegante que o diretor faça uma homenagem a si mesmoao enfocar com obviedade uma marca de pneus chamada “Lassetyre” – e se abrincadeira com Ratatouilleé divertida (com o restaurante “Gusteau’s” se transformando em “Gastow” naParis aqui vista), acaba apenas desapontando ao ser repetida pelo longa, já quea Pixar não costuma ser tão óbvia em suas piadas internas.

Desperdiçando também a oportunidadede mergulhar na lógica por trás da hierarquia deste curioso universo, Carros 2 traz carros dentro de carros (o“papautomóvel” dentro de um papamóvel) e dentro de aviões e barcos, numa claracadeia de dominância que poderia render boas piadas e discussões, mas quejamais é investigada ou explorada pelo roteiro. Mas o pior é perceber que nemmesmo a trama básica concebida por Lasseter e seus colaboradores faz o menorsentido, já que a revelação do vilão implica numa série de buracos absurdos emseus planos e motivações.

Como se não bastasse, o filme aindase encarrega de enviar mensagens nada positivas para seu jovem público, plantandoa ideia de que os “tranqueiras” (os “velhos”, “diferentes”, “rejeitados”)enxergam o mundo com inveja, ressentimento e más intenções. E o que dizer desua suposta mensagem ecológica, que a princípio parece advogar a importância deum combustível limpo e sustentável apenas para concluir com o inacreditávelmantra “uma vez gasolina,sempre gasolina”?

Um mantra que, substituída a palavra“gasolina” por “Pixar”, infelizmente já não mais se aplica.

Observação:o curta que precede o filme, Férias no Havaí, é igualmente frágil e pouco inspirado. Conta com certo charme por trazeros adoráveis personagens da trilogia Toy Story, mas só. A Pixar estava realmente num mau momento quando abraçou estesprojetos.

21de Junho de 2011

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Pablo Villaça, 18 de setembro de 1974, é um crítico cinematográfico brasileiro. É editor do site Cinema em Cena, que criou em 1997, o mais antigo site de cinema no Brasil. Trabalha analisando filmes desde 1994 e colaborou em periódicos nacionais como MovieStar, Sci-Fi News, Sci-Fi Cinema, Replicante e SET. Também é professor de Linguagem e Crítica Cinematográficas.

 

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