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Críticas por Pablo Villaça

Datas de Estreia: Nota:
Brasil Exterior Crítico Usuários
23/12/2011 01/01/1970 5 / 5 5 / 5
Distribuidora
Califórnia Filmes

Tudo Pelo Poder
The Ides of March

Dirigido por George Clooney. Com: Ryan Gosling, Paul Giamatti, Philip Seymour Hoffman, George Clooney, Evan Rachel Wood, Marisa Tomei, Jeffrey Wright, Max Minghella, Jennifer Ehle, Gregory Itzin, Michael Mantell.

Quarto trabalho de George Clooney na direção, Tudo pelo Poder representa um retorno do cineasta à boa forma depois do fraco O Amor Não Tem Regras, comprovando que ele se sai melhor quando está lidando com indivíduos inteligentes em situações complexas. Acompanhando a campanha de um pré-candidato democrata à presidência dos Estados Unidos, o filme já antecipa as complicações que perturbarão seus personagens em seu título original, que, com sua referência ao “Júlio César” de Shakespeare, nos sugere cuidado com os “idos de março” – mês no qual a história se passa.


Roteirizado por Clooney, seu parceiro habitual Grant Heslov e por Beau Willimon a partir da peça escrita por este último, o longa gira em torno das primárias democratas para decidir quem será o candidato do partido ao cargo mais importante do país – uma corrida dominada pelo carismático governador Mike Morris (Clooney), cuja campanha é comandada pelo experiente Paul Zara (Hoffman), chefe do assessor de imprensa Stephen Meyers (Gosling). Enfrentando um candidato mais conservador que conta com o inteligente Tom Duffy (Giamatti) como estrategista, a equipe de Morris traz ainda a estagiária Molly (Wood), que, ao se envolver com Meyers, permite que este descubra um segredo com potencial para provocar uma reviravolta completa na disputa.

Praticamente ignorando os republicanos, que só atuam perifericamente no sentido de tentar garantir a vitória do oponente de Mike por temerem a força do governador, Tudo pelo Poder é fascinante justamente por abordar uma impiedosa batalha entre integrantes do mesmo partido que, ganhe quem ganhar, obrigatoriamente se tornarão aliados futuros. Assim, quando observamos as conhecidas estratégias dos oponentes, constatamos que a natureza impiedosa das campanhas não é fruto necessariamente de divergências políticas (embora estas também existam), mas resultado direto da própria lógica eleitoreira – uma lógica que dita que informações negativas sobre o adversário devem sempre ser vazadas para a imprensa, já que invariavelmente resultarão em vantagem: se forem verídicas, prejudicarão o candidato; se forem falsas, ele perderá um dia sendo obrigado a desmenti-las.

Inteligente ao escalar-se como Morris, já que traz uma aura de sofisticação e inteligência ao personagem, Clooney encarna aqui um candidato democrata claramente inspirado em Obama (o da campanha, não o eleito) – algo refletido até mesmo em seus cartazes eleitorais: liberal e sem medo de assumir-se como tal, ele defende tópicos polêmicos com eloquência e maturidade, respeitando a divergência sem, contudo, aceitar posições absurdas como válidas apenas para agradar os eleitores. Resistente a ceder em pontos que lhe são caros apenas para aumentar suas chances na eleição, Morris lamenta já ter sido obrigado a se entregar a propagandas negativas contra o adversário e a se reunir com financiadores, ilustrando a natureza corruptora do próprio modelo eleitoral.

Remetendo em diversos momentos ao igualmente intrigante Tempestade Sobre Washington, dirigido por Otto Preminger em 1962, Tudo pelo Poder se beneficia da inteligência de seus personagens, que muitas vezes parecem estar numa partida de xadrez ou mesmo de pôquer, com direito a blefes que poderiam garantir uma vitória ou a ruína dos jogadores. Assim, quando Stephen toma a impensada atitude de aceitar um convite para encontrar-se com o rival Tom Duffy, o estrategista vivido por Philip Seymour Hoffman disseca suas motivações para tê-lo feito com precisão absoluta, demonstrando compreendê-lo talvez até melhor do que o próprio Stephen – o que, no entanto, não significa perdoá-lo, resultando naquela que talvez seja a melhor cena do filme.

Destaque em um longa com elenco fabuloso, Philip Seymour Hoffman encarna Paul com um misto de lealdade e paranoia que, associadas à inteligência do sujeito, formam uma combinação perigosa, ao passo que Paul Giamatti, como seu grande rival, leva o espectador a respeitar Tom mesmo torcendo contra seu sucesso. E se Evan Rachel Wood confere vulnerabilidade à bela Molly, é um prazer ver Gregory Itzin roubando a cena ao discursar em um velório (e o fato de o ator ter interpretado um presidente corrompido na série 24 Horas acaba adicionado um subtexto curioso à narrativa). No entanto, o centro de Tudo pelo Poder é mesmo o assessor interpretado por Ryan Gosling, cujo idealismo inicial é o primeiro passo do grande arco dramático do roteiro à medida que percebemos como ele rapidamente cederá aos piores impulsos para inicialmente defender seu candidato e, em seguida, a si mesmo.

Com uma fotografia eficiente de Phedon Papamichael, que acerta tanto no simbólico (como no plano que traz Stephen articulando em contraluz, pequeno, por trás da gigantesca bandeira norte-americana) quanto na atmosfera da narrativa (como o encontro mergulhado em sombras de Stephen e Morris), Tudo pelo Poder ainda merece aplausos pela rima temática perfeita que amarra suas pontas, da encenação para uma plateia do plano inicial à entrevista em rede nacional do final.

Mesmo não revelando nada de novo sobre o processo eleitoral norte-americano (ou brasileiro ou francês ou...), Tudo pelo Poder envolve cálculo e intriga do princípio ao fim.

Observação: esta crítica foi originalmente publicada como parte da cobertura da Mostra de São Paulo de 2011.

04 de Novembro de 2011

Pablo Villaça, 18 de setembro de 1974, é um crítico cinematográfico brasileiro. É editor do site Cinema em Cena, que criou em 1997, o mais antigo site de cinema no Brasil. Trabalha analisando filmes desde 1994 e colaborou em periódicos nacionais como MovieStar, Sci-Fi News, Sci-Fi Cinema, Replicante e SET. Também é professor de Linguagem e Crítica Cinematográficas.

 

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