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Críticas por Pablo Villaça

Datas de Estreia: Nota:
Brasil Exterior Crítico Usuários
07/05/2010 01/01/1970 2 / 5 2 / 5
Distribuidora
Duração do filme
122 minuto(s)

O Mundo Imaginário do Dr. Parnassus
The Imaginarium of Dr. Parnassus

Dirigido por Terry Gilliam. Com: Heath Ledger, Christopher Plummer, Verne Troyer, Tom Waits, Lily Cole, Andrew Garfield, Jude Law, Johnny Depp, Colin Farrell.

Notório antes mesmo de ser completado por ter se tornado o último trabalho do talentoso Heath Ledger, morto precocemente aos 28 anos de idade, O Mundo Imaginário de Dr. Parnassus, ganhou, em razão da tragédia, um caráter irrevogável de grande homenagem à carreira do ator – e não apenas Johnny Depp, Colin Farrell e Jude Law aceitaram filmar pequenas participações completando a performance de Ledger (algo que comentarei adiante), doando seus cachês à filha do rapaz, como o próprio longa termina com a frase: “Um Filme de Heath Ledger e amigos”.  Mais tocante, impossível. Assim, é lamentável que a obra também seja uma tremenda bagunça.

Escrito pelo diretor Terry Gilliam ao lado de Charles McKeown, o roteiro gira em torno de um grupo de aparentes saltimbancos liderado pelo sempre bêbado personagem-título (Plummer). Depois de ter feito com uma aposta com o Diabo (Waits) e ser premiado com a vida eterna, Parnassus foi condenado a ceder sua filha à criatura assim que a garota completar 16 anos – e com o aniversário da moça se aproximando, o sujeito se encontra torturado sobre o que fazer. É quando a trupe salva Tony (Ledger), um homem que havia sido enforcado e que, sofrendo de amnésia, passa a acompanhar os demais em suas viagens pelo mundo – algo que vem a calhar, posto que Parnassus e o Diabo fazem uma nova aposta que tem Valentina (Cole) como prêmio: aquele que conquistar primeiro cinco almas será o vencedor. Com a ajuda de Tony, então, o velho busca atrair clientes que aceitem atravessar o misterioso espelho presente durante seus shows e que, na realidade, funciona como um portal para um universo no qual Parnassus dá vida à imaginação das pessoas.

Diretor conhecido justamente pelo caráter fantasioso e imaginativo da maior parte de seus projetos (de Os Bandidos do Tempo a Os Irmãos Grimm, passando por As Aventuras do Barão Munchaussen e Brazil), Terry Gilliam encontra, aqui, a oportunidade ideal de empregar os efeitos visuais digitais de uma maneira inédita em sua carreira – e, de fato, as seqüências ambientadas no Imaginário são visualmente magníficas, usando as novas tecnologias sem, com isso, abandonarem a sensibilidade particular do cineasta (e não é por acaso que muito do que vemos nestas cenas remete às animações que Gilliam produzia na época do Monty Python). O design de produção de Anastasia Masaro, aliás, certamente merece ser considerado na temporada de premiações que se aproxima, já que, do “pântano” de garrafas às gigantescas escadas que sobem em direção às nuvens, o filme jamais deixa de surpreender o espectador com suas criações.

Da mesma forma, o diretor de fotografia italiano Nicola Pecorini contribui para o tom fabulesco através de paleta que, muitas vezes investindo num evocativo sépia, também ressalta a atmosfera ameaçadora da narrativa através do belo uso de sombras. Mas, mais uma vez, a sensibilidade particular de Terry Gilliam se apresenta e, claro, voltamos a ver marcas registradas de seus trabalhos, como os quadros inclinados que conferem uma aura de desequilíbrio à trama e os planos que, através de lentes específicas, deformam levemente os rostos de seus atores.

E já que mencionei os atores, é preciso apontar que Heath Ledger mais uma vez exibe seu notório carisma e sua presença de cena dominante ao encarnar Tony como uma criatura ambígua e pouco confiável – mas também é necessário dizer que, por culpa do roteiro e/ou das alterações impostas por sua morte durante as filmagens, a composição se torna imperfeita, incompleta, deixando a clara impressão de que parte importante da história do personagem jamais foi estabelecida. Aliás, a própria narrativa surge com graves problemas, muitas vezes saltando abruptamente de um incidente a outro sem que uma progressão lógica dos acontecimentos pareça ocorrer – algo que, mais uma vez, só posso atribuir às tentativas feitas por Gilliam de reestruturar o roteiro depois do falecimento de seu protagonista.

Neste sentido, diga-se de passagem, a decisão de escalar três atores diferentes para interpretarem Tony sempre que este atravessa o espelho de Parnassus representou uma ótima sacada do cineasta, já que, inclusive, não desafia a lógica da trama. E o curioso é que, assim como notoriamente ocorreu com Ángela Molina e Carole Bouquet em Esse Obscuro Objeto do Desejo, de Buñuel, a substituição dos atores ao longo da projeção nem sempre salta aos olhos do espectador, o que representa um efeito interessante. Completam o elenco, ainda, Christopher Plummer (obrigado a encarnar Parnassus num tom monocórdio e aborrecido, já que o sujeito se encontra sempre bêbado e deprimido), Andrew Garfield (tão desinteressante quanto em Leões e Cordeiros), Verne Troyer (que cria o único personagem divertido do longo), Tom Waits (intenso e interessante como o Diabo) e Lily Cole (que mais parece uma boneca de porcelana).

Longo e com uma estrutura frouxa resultante das várias alterações, O Mundo Imaginário de Dr. Parnassus ainda peca pela resolução artificial que poderia perfeitamente ser descrita como um decepcionante diabo ex machina. Ledger merecia uma despedida melhor.

(Texto originalmente publicado durante a cobertura da Mostra de SP 2009.)

26 de Outubro de 2009

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Pablo Villaça, 18 de setembro de 1974, é um crítico cinematográfico brasileiro. É editor do site Cinema em Cena, que criou em 1997, o mais antigo site de cinema no Brasil. Trabalha analisando filmes desde 1994 e colaborou em periódicos nacionais como MovieStar, Sci-Fi News, Sci-Fi Cinema, Replicante e SET. Também é professor de Linguagem e Crítica Cinematográficas.

 

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