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Críticas por Pablo Villaça

Datas de Estreia: Nota:
Brasil Exterior Crítico Usuários
09/03/2007 01/01/1970 1 / 5 / 5
Distribuidora

Norbit
Norbit

Dirigido por Brian Robbins. Com: Eddie Murphy, Thandie Newton, Terry Crews, Cuba Gooding Jr., Mighty Rasta, Clifton Powell, Eddie Griffin, Katt Williams, Marlon Wayans.

A Melhor Defesa é o Ataque; Os Donos da Noite; Um Distinto Cavalheiro; O Príncipe das Mulheres; Um Tira da Pesada 3; Um Vampiro no Brooklyn; Dr. Dolittle 2; Santo Homem; Até que a Fuga os Separe; O Professor Aloprado 2; A Creche do Papai; Mansão Mal-Assombrada. Lista assustadora, não? Como é fácil perceber, a carreira de Eddie Murphy é consistente na péssima qualidade de seus trabalhos – e mesmo os filmes que se salvam, como O Rapto do Menino Dourado, Um Tira da Pesada 2, Um Príncipe em Nova York, Dr. Dolittle, Showtime e Sou Espião, estão longe de ser obras-primas (na realidade, excetuando-se as animações dubladas pelo ator, apenas quatro filmes protagonizados por Murphy são inquestionavelmente ótimos: 48 Horas, Trocando as Bolas, Um Tira da Pesada e O Professor Aloprado – e, destes, apenas um tem menos de 23 anos de lançamento). Assim, é admirável que, com um passado já tão recheado de atrocidades cinematográficas, o comediante tenha conseguido, com Norbit, a proeza de realizar aquele que, sem dúvida, é o pior filme de sua já desastrosa carreira.


Escrito por Jay Scherick e David Ronn a partir de uma história concebida por Murphy e seu irmão Charles, o roteiro é centrado em Norbit (Murphy), um sujeito inseguro que, criado no orfanato do avarento Sr. Wong (Murphy novamente), acaba se casando com a imensa Rasputia (Murphy mais uma vez), irmã caçula de três marginais que extorquem os comerciantes locais em troca de “proteção”. Infeliz e reprimido, Norbit finalmente encontra a possibilidade de realização pessoal ao reencontrar Kate (Mur... digo, Thandie Newton), um amor de infância que retornou à cidade a fim de assumir a administração do orfanato no qual cresceram. Os irmãos de Rasputia, porém, têm outros planos para a instituição: comprá-la a fim de transformá-la em um inferninho chamado... oh, Deus, até dói, escrever isso... Mamilópolis.

No entanto, pior do que esta premissa é seu desenvolvimento em uma trama que dura 100 longos minutos: sem conter uma única idéia original, a equipe de roteiristas se limita a chupar as piores piadas dos trabalhos anteriores de Murphy - especialmente dos dois capítulos de O Professor Aloprado. E por que roubam apenas as piores? A resposta, suponho, é que estes dois roteiristas não saberiam reconhecer uma boa piada nem mesmo se esta os atropelasse com um trator (e é triste reconhecer que até mesmo Murphy parece ter perdido seu faro para o riso). A maior prova desta cegueira para a comédia, aliás, reside no bordão simplesmente estúpido repetido ad nauseam por Rasputia: “How you doin’?” (sim, exatamente como o Joey de “Friends”, mas sem a mesma graça).

Fazendo jus à porcaria do roteiro vem a direção incompetente de Brian Robbins, cuja falta de talento para o Cinema é tão óbvia quanto o preconceito com que Norbit enxerga o mundo (chegarei lá em instantes). Em certo momento, por exemplo, ele tenta criar uma gag envolvendo a excitação do personagem-título ao enxergar o decote de Kate, que não percebe o que está acontecendo – mas a marcação da cena é tão artificial que a impressão que temos é a de que Thandie Newton praticamente sobe na cama do sujeito para esfregar os seios em seu rosto. Já no restante do tempo, Robbins se limita a apontar a câmera desajeitadamente para os atores, incluindo alguns closes vez por outra para que possamos admirar o excelente trabalho de maquiagem feito em Murphy.

Aliás, não há dúvida de que a maquiagem vista em Norbit é tão ou mais brilhante quanto aquela empregada em O Professor Aloprado 2 – porém, em vez de parabenizar a equipe responsável pelo trabalho, meu desejo é de repreendê-la por emprestar seu talento a um projeto tão repulsivo. Se Einstein lamentou posteriormente que suas teorias tenham sido empregadas na construção da bomba atômica, os profissionais da Cinovation Studios provavelmente se matarão de desgosto ao olharem para trás e perceberem que seus dons foram utilizados a serviço do Mal. Enquanto isso, Eddie Murphy, um ator que no passado provou seu brilhantismo para caracterizações ao criar todos os integrantes da família Klump, desta vez surge irregular, chegando até mesmo a exibir variações gritantes nas vozes concebidas para seus personagens (e sejamos sinceros: Norbit nada mais é do que uma cópia do tímido Jiff Ramsey que ele viveu em Os Picaretas).

Sem demonstrar o menor embaraço por apelar para o que há de mais rasteiro e pobre no humor, Norbit transforma em mantra sua predileção por piadas de banheiro, incluindo inúmeros incidentes e referências envolvendo gases e outros dejetos – e, na falta destes, até mesmo um cachorro falante (juro!) é empregado como recurso desesperado para provocar o riso (e sem sucesso).

Mas se o maior problema desta coisa (digo... “filme”) residisse em sua falta de graça, o longa poderia ser simplesmente ignorado como tantos outros exemplares fracassados do gênero. Em vez disso, Norbit se destaca por ser, além de estúpido, moralmente repreensível – o que o torna absolutamente desprezível. Em primeiro lugar, todo o seu “humor” baseia-se na seguinte conclusão: pessoas gordas são ridículas por natureza. Assim, somos bombardeados com inúmeras cenas que se limitam a mostrar Rasputia tomando banho, lavando um carro, fazendo ginástica e por aí afora, como se somente o fato de vermos uma criatura obesa fazendo qualquer coisa fosse algo suficientemente engraçado (se isto fosse verdade, todos os encontros dos Vigilantes do Peso seriam televisionados em horário nobre). Em contrapartida, a magreza doentia de Thandie Newton é reverenciada como um exemplar inconteste de beleza feminina - como se vê-la agitando os braços esqueléticos fosse uma imagem de irresistível sensualidade. Aliás, Norbit é um filme cuja misoginia flagrante deveria ser repudiada em público: quando não são motivo de escárnio, as mulheres são vistas como meros objetos sexuais e até mesmo como criaturas ansiosas para serem exploradas pelos machos dominantes (basta dizer que duas delas praticamente gozam em cena ao anteciparem os “prazeres” de serem transformadas em prostitutas e agenciadas por uma dupla de cafetões). Finalmente, os roteiristas são incapazes de criar qualquer tipo de personagem que não recaia em um estereótipo: chineses, mexicanos, italianos e negros são vistos não como indivíduos, mas como uma coleção de clichês ofensivos e preconceituosos.

Felizmente, Eddie Murphy não ganhou o Oscar de Melhor Ator Coadjuvante por seu desempenho em Dreamgirls (aliás, está na hora de tomarmos o de Cuba Gooding Jr., que volta a oferecer uma performance ridícula nesta bomba). Se isto tivesse ocorrido, a Academia teria que viver o embaraço de premiar um indivíduo que, além de não conseguir protagonizar um filme de qualidade há mais de uma década, ainda tenta arrancar o riso ao ridicularizar não apenas as mulheres, mas também o maior número possível de etnias. No que diz respeito a preconceitos, Eddie Murphy deixa Mel Gibson e Michael Richards no chinelo.

09 de Março de 2007

Pablo Villaça, 18 de setembro de 1974, é um crítico cinematográfico brasileiro. É editor do site Cinema em Cena, que criou em 1997, o mais antigo site de cinema no Brasil. Trabalha analisando filmes desde 1994 e colaborou em periódicos nacionais como MovieStar, Sci-Fi News, Sci-Fi Cinema, Replicante e SET. Também é professor de Linguagem e Crítica Cinematográficas.

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