Seja bem-vindx!
Acessar - Registrar

Críticas por Pablo Villaça

Datas de Estreia: Nota:
Brasil Exterior Crítico Usuários
18/04/2008 01/01/1970 1 / 5 / 5
Distribuidora
Duração do filme
90 minuto(s)

Uma Chamada Perdida
One Missed Call

Dirigido por Eric Valette. Com: Shannyn Sossamon, Edward Burns, Ana Claudia Talancón, Azura Skye, Johnny Lewis, Rhoda Griffis, Ariel Winter, Margaret Cho, Ray Wise.

 

O espectador médio norte-americano não gosta de ler legendas. E é esta característica, associada a algo que só posso considerar como sendo preguiça mental, que possibilita que os grandes estúdios de Hollywood inundem o mercado internacional com refilmagens em sua maioria porcas de obras criadas em países de língua não-inglesa. Sim, seria mais barato pagar um ou dois milhões de dólares pelos direitos de distribuição de um longa japonês ou sul-coreano, legendá-lo e exibi-lo nos circuitos alternativos para um público exigente e seleto, mas as possibilidades de lucros maiores surgem se, além dos direitos de refilmagem, o estúdio gastar outros 70 milhões numa nova versão e no marketing para lançá-la – especialmente porque pode contar com a já mencionada preguiça intelectual do público, que prefere pagar 12 dólares por um ingresso de cinema do que um terço deste valor para alugar a versão original, que, além de mais barata, a lógica sugere ser de melhor qualidade (caso contrário, por que alguém se interessaria em refazê-la?).

 

É claro que, vez por outra, boas versões acabam sendo produzidas, como indicam O Chamado e Água Negra, mas isto vem se tornando cada vez mais raro – e basta assistir a coisas como O Grito, O Olho do Mal ou Imagens do Além para constatar que nosso tempo seria mais bem empregado conferindo as produções que os inspiraram (e observem que cito apenas a onda recente dos filmes de terror realizados na Tailândia, na Coréia do Sul e no Japão). Aliás, isto se aplica perfeitamente a este Uma Chamada Perdida, que, inspirado no ótimo longa dirigido por Takashi Miike em 2003, acompanha uma série de mortes prenunciadas por uma chamada de celular: depois de tocar com um ringtone específico, o aparelho da vítima registra uma chamada não atendida que, ao ser ouvida, traz a voz da própria pessoa no momento de sua morte. Quando o momento registrado no telefonema chega, a tragédia se confirma e uma nova vítima é escolhida a partir da lista existente no aparelho cujo dono acabou de morrer.

 

Estreando como diretor em Hollywood, o francês Eric Valette já se mistura à multidão de cineastas sem personalidade nos primeiros minutos do longa, quando insiste num simbolismo óbvio ao enfocar, durante os créditos iniciais, a onipresença dos celulares no mundo moderno – e, não satisfeito, ainda enquadra um anúncio que diz “Seu telefone, sua vida”, arrematando a mensagem com um figurante que surge pregando as virtudes do sexo pelo telefone. A partir daí, Valette se entrega de vez às convenções do gênero ao carregar no uso dos efeitos sonoros para assustar o público e ao incluir repetitivos planos-detalhe de ponteiros de relógio, numa tentativa clara e infrutífera de gerar tensão. Para piorar, o diretor não se preocupa nem mesmo com a continuidade da ação, já que, em certo momento, a protagonista, que mantinha uma conversa por celular em seu quarto, surge já na rua entre uma frase e outra. Em contrapartida, Valette consegue criar ao menos uma boa transição ao fundir a imagem de uma câmera oculta com a do quarto enfocado no tempo presente – num recurso batido, mas que ao menos se mostra eficaz.

 

Enquanto isso, o péssimo roteiro de Andrew Klavan (autor dos livros que originaram os terríveis Crime Verdadeiro e Refém do Silêncio) abusa de diálogos expositivos (“Eles estão bem, considerando que a filha de 24 anos morreu afogada em um laguinho no fundo de casa”) e dos personagens absurdos. Mas o que realmente incomoda é o fato de ninguém fornecer informações importantes sobre o que está realmente acontecendo: por que as pessoas que recebem as chamadas jamais falam sobre suas visões, por exemplo? E por que ninguém tem a idéia óbvia de simplesmente apagar toda a lista de endereços do celular? De modo geral, as novas vítimas basicamente se limitam a esperar pela chegada da morte, não fazendo nada para evitá-la – um impulso básico de sobrevivência que apenas a protagonista parece exibir.

 

Em vez disso, o roteirista se limita a criar subtramas bobas com o intuito de tentar tornar os personagens mais reais, mas sem sucesso – ou o fato de Brian terminar com uma colega de faculdade e demonstrar interesse por outra exerce qualquer tipo de influência sobre a trama? No entanto, Uma Chamada Perdida ultrapassa a fronteira do ridículo ao investir num trauma do passado da protagonista que se manifesta toda vez que esta se aproxima de um olho mágico. Sim, eu disse “olho mágico” – e logo aquilo se torna risível a ponto de soar como auto-paródia, como se esperássemos um contrazoom como aquele empregado por Hitchcock em Um Corpo que Cai. Da mesma forma, é difícil conter o riso quando um pobre gato é puxado para a água por uma mão fantasmagórica, o que me leva a crer que ele também tenha recebido uma mensagem pelo celular que trazia um “Miau... Miau... Mi...aaaaaaarghhhhh!”.

 

Desperdiçando ótimas seqüências do original (como aquela que enfocava uma morte “ao vivo” e que aqui se transforma numa piada de mau gosto), Uma Chamada Perdida até que acerta no visual das criaturas vistas pelos “amaldiçoados” e que realmente despertam um certo incômodo no espectador, mas até estes efeitos acabam se tornando ridículos quando finalmente vemos um “bebê demônio” segurando um aparelho celular e que parece ter saído diretamente da série Ally McBeal. E nada de elogioso pode ser dito com relação ao final do longa, que, além de frouxo, é desonesto ao desrespeitar as “regras” pré-estabelecidas pelo próprio filme. Não é à toa que, em certo momento, um taxista suspira impacientemente ao escutar a heroína (a bela Shannyn Sossamon) explicando o que estava acontecendo para o mocinho (o sempre fraco Edward Burns), já que aquela era a mesmíssima reação que eu estava experimentando.

 

Agora só nos resta a esperança de que o gênero entre de férias por não ter mais o que inventar: depois de computadores, máquinas fotográficas, fitas de VHS e celulares amaldiçoados, não restam muitos aparelhos que possam ser dominados por criaturas fantasmagóricas, matando seus donos ao serem utilizados. O que poderia vir a seguir, afinal de contas? Um vibrador da morte?

 

Hum... e por que não?

 

18 de Abril de 2008

Comente esta crítica em nosso fórum e troque idéias com outros leitores! Clique aqui!

Pablo Villaça, 18 de setembro de 1974, é um crítico cinematográfico brasileiro. É editor do site Cinema em Cena, que criou em 1997, o mais antigo site de cinema no Brasil. Trabalha analisando filmes desde 1994 e colaborou em periódicos nacionais como MovieStar, Sci-Fi News, Sci-Fi Cinema, Replicante e SET. Também é professor de Linguagem e Crítica Cinematográficas.

 

Para dar uma nota para este filme, você precisa estar logado!