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Críticas por Pablo Villaça

Datas de Estreia: Nota:
Brasil Exterior Crítico Usuários
17/09/2004 07/07/2004 1 / 5 1 / 5
Distribuidora
Duração do filme
126 minuto(s)

Rei Arthur
King Arthur

Dirigido por Antoine Fuqua. Com: Clive Owen, Keira Knightley, Ioan Gruffudd, Stellan Skarsgård, Stephen Dillane, Ray Winstone, Hugh Dancy.

Muitos dos filmes que supostamente deveriam girar em torno de incidentes reais parecem fazer questão de rechear suas narrativas com imprecisões factuais – em alguns casos, os resultados são positivos (Max, O Preço da Paz, Uma Mente Brilhante, Eu Tu Eles, Amadeus; em outros, negativos (Gladiador, O Custo da Coragem, Falcão Negro em Perigo, Carandiru). Porém, creio que, até hoje, ninguém havia se atrevido a fazer algo tão absurdo quanto o que acontece em Rei Arthur: logo no início da projeção, o filme afirma que os acontecimentos que exibirá em seguida foram inspirados por `novas evidências históricas` sobre a lenda de Arthur – o que, além de ser uma mentira pavorosa, ainda nos leva a questionar a sanidade dos produtores. Ou eles realmente acreditam que Guinevere foi uma guerreira que, além de fazer mágicas com arco e flecha, ainda participava de batalhas vestindo roupas de couro apertadas e reveladoras?

O roteiro escrito por David Franzoni (que já havia cometido Gladiador e Amistad) não altera a História, mas a inventa – e, embora isto não seja algo necessariamente ruim, o que sai da imaginação do sujeito é tão estúpido que inevitavelmente afunda o projeto. Uma coisa é copiar a premissa de O Resgate do Soldado Ryan e enviar Arthur e os Cavaleiros da Távola Redonda em uma missão suicida para resgatar um jovem; outra completamente diferente é transformar os cavaleiros em versões medievais do estereótipo do `Herói Americano` contemporâneo: em certo momento, um deles se aproxima de uma pobre camponesa e diz: `Eu sou um oficial romano. Você está a salvo agora!`, o que imediatamente nos faz lembrar de qualquer filme protagonizado pelos `valentes soldados do exército norte-americano`. Como se não bastasse, Franzoni ainda faz uma indigesta salada de frutas com todas as lendas referentes ao personagem-título, subvertendo o simbolismo de Excalibur e apresentando uma versão de Merlin que só não é pior do que... bom, do que a versão de Guinevere vista no filme.

Embora planejado como um veículo para o galã britânico Clive Owen, Rei Arthur falha grosseiramente em seu propósito, já que o roteiro equivocado e a má composição do ator transformam o herói lendário em uma figura chata e mal-humorada. Aliás, a chatice de Arthur é rivalizada apenas pela de Lancelot – que, apesar de ser retratado como seu `melhor amigo`, mal parece suportá-lo, já que a dupla passa toda a projeção discutindo. Aliás, o roteiro parece acreditar que a única forma de desenvolver um personagem é através de brigas: além de Lancelot e Arthur, os dois únicos outros elementos que se destacam dos demais são Guinevere (que, sim, discute com Lancelot e Arthur) e o vilão Cerdic (que briga com todo mundo). Há, também, os estereótipos de costume: o guerreiro engraçadinho, o sujeito durão que só pensa em mulheres, e assim por diante, mas nem isso é o bastante para que guardemos suas feições.

Aliás, `sutileza` é um conceito que o cineasta Antoine Fuqua parece ter ignorado ao dirigir o elenco de Rei Arthur: até mesmo o geralmente eficaz Stellan Skarsgård (que se saiu bem mesmo no fraco O Exorcista: O Início) torna-se ridículo como Cerdic, cuja `maldade` é praticamente anunciada aos berros pelo filme – além de atacar seus próprios soldados, ele mata mulheres inocentes e ameaça mutilar o próprio filho (e não duvido que, em alguma cena eliminada da versão final, ele aparecesse arrancando a cabeça de pobres gatinhos...).

Enquanto isso, Arthur é um aspirante a William Wallace (o herói de Coração Valente) ou a Aragorn (você sabe de que filme; porém, na falta de um grande exército, ele se limita a fazer um discurso pré-batalha para... cinco pessoas, o que não deixa de ser hilário. Já Guinevere... bom, pense em Halle Berry em Mulher-Gato e terá uma idéia do estrago (depois de disparar uma flecha, Keira Knightley chega a fazer pose para a câmera – o que só não é mais constrangedor do que os rosnados que ela solta durante o filme).

Ah, eu mencionei que Rei Arthur inclui seqüências de batalha; porém, antes que algum aficionado pelo gênero seja enganado, devo esclarecer que estas são conduzidas com terrível incompetência por Fuqua, revelando-se confusas e mesmo aborrecidas. E nem preciso dizer que este é o tipo de produção na qual o Vilão e o Mocinho irão trocar olhares durante todo o confronto (apesar da infinidade de corpos em movimento entre os dois e da própria dimensão do campo), vindo a enfrentar-se só no fim da seqüência (e somente depois que o Assistente-do-Vilão e o Melhor-Amigo-do-Mocinho já tenham resolvido suas diferenças).

Em certo momento da trama, Arthur explica que se reúne com seus cavaleiros em uma távola redonda para que ninguém tenha uma posição diferente das dos demais, já que (duh!) não há cabeceiras neste tipo de mesa. Curiosamente, no instante em que ele esclarece este fato, encontra-se sentado em um `lado` do círculo, enquanto todos os seus companheiros permanecem no `lado` oposto.

Pelo visto, o conceito de `igualdade` empregado pelo filme é tão frágil quanto o de `evidências históricas`.
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12 de Setembro de 2004

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Pablo Villaça, 18 de setembro de 1974, é um crítico cinematográfico brasileiro. É editor do site Cinema em Cena, que criou em 1997, o mais antigo site de cinema no Brasil. Trabalha analisando filmes desde 1994 e colaborou em periódicos nacionais como MovieStar, Sci-Fi News, Sci-Fi Cinema, Replicante e SET. Também é professor de Linguagem e Crítica Cinematográficas.

 

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