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Críticas por Pablo Villaça

Datas de Estreia: Nota:
Brasil Exterior Crítico Usuários
22/01/2023 22/01/2023 4 / 5 4 / 5
Distribuidora
HBO Max
Duração do filme
55 minuto(s)

The Last of Us - S01E02: Infected
The Last of Us - S01E02: Infected

Dirigido por Neil Druckmann. Roteiro de Craig Mazin. Com: Pedro Pascal, Bella Ramsey, Anna Torv, Christine Hakim, Yayu A.W. Unru, Philip Prajoux.

Musgos, grama, trepadeiras, a água acumulada no saguão de um velho hotel, os papeis de parede descascados em seus corredores e, claro, o pequeno sapo que passeia sobre as teclas de um piano arruinado: para onde quer que olhemos durante Infected, segundo episódio de The Last of Us, o verde provavelmente terá dominância na imagem. Sim, há variações em sua tonalidade que sugerem uma miríade de interpretações possíveis, indo da morte e da degradação até o retorno triunfante da Natureza em um mundo pós-apocalíptico – ideias que, neste caso, se encontram tematicamente de modo enfático.


Não é à toa que a sequência que abre o episódio estabelece tamanho contraste visual com o que virá a seguir: situada em Jacarta, capital da Indonésia, ela acompanha os primeiros momentos da pandemia que irá destruir quase toda a humanidade, trazendo uma fotografia saturada, quente, que oferece um vislumbre de toda a vida que se perderá. Convocada pelo exército do país para examinar o cadáver de uma mulher que havia atacado os colegas de trabalho em uma fábrica de farinha e grãos, a micologista Ibu Ratna (interpretada pela veterana atriz indonésia Christine Hakim) não demora a perceber a dimensão da ameaça representada pela versão evoluída do fungo Ophiocordyceps e, numa cena tensa rodada quase toda em um único plano (e num cenário dominado pelo amarelo), oferece a única solução que julga ter chances de sucesso: bombardear a cidade e todos os seus habitantes. É um diagnóstico inesperado partindo de uma cientista de modos tão calmos, o que salienta sua falta de esperança diante da descoberta e torna a jornada de Joel (Pascal), Ellie (Ramsey) e Tess (Torv) ainda mais urgente.

A partir daí – e já tendo consolidado o universo da história no piloto -, Infected toma uma direção inesperada para uma série em seu princípio e concentra seu foco nos três personagens principais, aproveitando para desenvolver a dinâmica entre estes e oferecer um pouco mais de informações sobre quem são (ou o que se tornaram). Amargo, cético e monossilábico, Joel nada tem do calor exibido em suas interações com a filha, registrando, duas décadas depois da morte desta, os efeitos de uma perda insuperável. Interrompendo Ellie ao ouvi-la explicar que sua imunidade ao fungo pode representar a chance de criação de uma vacina, ele deixa claro já não ser capaz de nutrir qualquer tipo de esperança a não ser o de sobreviver naquelas condições miseráveis, demonstrando disposição até mesmo de executar a menina caso perceba que esta configura um risco à sua segurança. Esta faceta impiedosa, aliás, é reforçada pela afirmação de Tess de não serem “boas pessoas”, indicando um autojulgamento que, de modo até contraditório, leva o espectador a perceber que aqueles dois adultos provavelmente são mais confiáveis do que qualquer outro humano visto até ali.

Mas o centro de The Last of Us reside na relação entre Joel e Ellie, que aqui começa a ser explorada com mais cuidado: vivida pela excelente Bella Ramsey como uma adolescente corajosa, mas sem muito conhecimento sobre os perigos que encontrará fora da Zona de Quarentena, Ellie age como a quase criança que é, divertindo-se ao entrar pela primeira vez em um hotel e tratando a solenidade de seus guias com irreverência. Ao mesmo tempo, ela projeta uma vulnerabilidade clara e uma reserva em seu comportamento que sugere experiências traumáticas que ela gostaria de manter para si. Assim, considerando as armaduras usadas pelos dois personagens, é interessante como o diretor Neil Druckmann ilustra o início do rompimento destas barreiras de modo sutil, enfocando o primeiro toque entre Joel e Ellie quando ele a ajuda a ficar em pé e mostrando, em dois momentos, como ele a estuda em silêncio sem que a garota perceba. De maneira similar, é admirável como Pedro Pascal não carrega em sua composição, dizendo muito através de sua expressão triste ou do olhar rápido que lança ao relógio de pulso presenteado por sua filha e que denuncia como o sujeito já identifica – mesmo que inconscientemente – as similaridades na dinâmica que se forma.

No entanto, Infected não é eficiente apenas nas sutilezas; ao precisar descarregar uma tonelada de informações sobre o espectador, explicando os diferentes tipos de monstros existentes e a existência de uma rede de fibras que parece conectar todas as criaturas, o roteiro de Craig Mazin executa a tarefa de exposição do modo mais orgânico possível, usando a inexperiência de Ellie como desculpa para uma pequena aula de Tess – o que pode não ser elegante de um ponto de vista narrativo, mas cumpre sua função. E ainda que a revelação no terceiro ato do episódio mais uma vez exponha como originalidade não é uma preocupação de The Last of Us (praticamente todas as obras envolvendo zumbis trarão um incidente similar), ao menos permite que este segundo capítulo seja concluído com um impacto emocional que surpreende por vir tão precocemente.

Marcando a estreia de Druckmann na direção fora do mundo dos games, Infected aqui e ali peca por adotar um ponto de vista que remete ao de um jogador, mantendo a câmera atrás e um pouco acima dos personagens enquanto os segue, mas no restante do tempo o diretor constrói bem a tensão ao investir num silêncio que ressalta cada ruído (como o ranger dos degraus, goteiras, cliques ameaçadores) e ao extrair suspense da revelação da aparência dos monstros, que primeiro são apresentados em contraluz, fora de foco ou atrás de vidros sujos que escondem os detalhes de suas deformações. Aliás, o design de produção de John Paino, que já elogiei pelo uso das cores, é notável também ao desvelar a propagação dos fungos pelo ambiente, crescendo nas paredes, nas escadas e aqui e ali ocultando pedaços de cadáveres decompostos entre suas projeções repugnantes.

Fazendo uma referência divertida à cena da cozinha em Parque dos Dinossauros em um instante de tensão envolvendo Joel, Ellie e um zumbi, Infected continua a manter a promessa do episódio-piloto de criar uma narrativa que se equilibra bem entre ação e emoção, compreendendo que é nossa ligação com aqueles indivíduos que tornará a experiência memorável.

Observação (spoiler): há muito simbolismo nos momentos finais de Tess, quando – diferentemente do que ocorre no game – é atacada por um zumbi que projeta fibras fúngicas em sua boca. É bastante provável que Druckmann e Mazin tenham tentado criar, ali, uma metáfora para a violência sexual, mas, se de fato for o caso (e, considerando a falta de função aparente daquele instante, acredito que seja), a tentativa mais distrai do que acrescente à narrativa.

24 de Janeiro de 2023

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Pablo Villaça, 18 de setembro de 1974, é um crítico cinematográfico brasileiro. É editor do site Cinema em Cena, que criou em 1997, o mais antigo site de cinema no Brasil. Trabalha analisando filmes desde 1994 e colaborou em periódicos nacionais como MovieStar, Sci-Fi News, Sci-Fi Cinema, Replicante e SET. Também é professor de Linguagem e Crítica Cinematográficas.

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